22 - Recomeçar

Erik Wallar

Durante minha existência em diversos momentos eu realmente não sabia o motivo de existir ou qual o objetivo da minha criação.

No início acreditava que meu destino era honrar minha Casa e obedecer aos meus Senhores, mas quando parti em minha jornada solitária essa certeza se perdeu.

Ao tentar levar uma vida simples percebi que ela não era para mim, um guerreiro não foi feito para uma vida assim, os instintos alimentados por tantos anos acabam falando mais alto.

Ao me tornar um mercenário acreditei estar sendo útil às pessoas e à sociedade, porém inúmeras foram as vezes em que duvidei disso.

Será que eu poderia fazer ainda mais? Teria sido criado somente com essa finalidade? 

Talvez se eu tivesse, quando houve a oportunidade, me esforçado mais para descobrir o que sou e qual minha origem as coisas fossem diferentes, quem sabe?

Enquanto tive Rayka ao meu lado acreditei que meu objetivo, enquanto estivéssemos juntos, era o de simplesmente ser feliz ao lado dela, levando uma vida mais pacífica, embora eu ainda “trabalhasse”, mas quando ela se foi eu acabei me perdendo no vazio outra vez.

Os dias se tornaram amargos, dedicava-me apenas à matar, sem alegrias, sem maiores objetivos, e isso estava me cansando.

Mas o destino sempre nos reserva surpresas, mesmo nem todas sendo agradáveis, e ter conhecido a menina do restaurante renovou minhas esperanças de dias melhores.

Me entregar a um novo amor seria um erro diante de tudo o que eu já tinha vivenciado?

Fechar os olhos para a possibilidade de ter dias felizes seria burrice.

Eu estava há bastante tempo mergulhado em amargura, isso me fazia mal, estava me cansando. Ao menos tendo alguém para pensar, mesmo que apenas por alguns anos, me fazia feliz outra vez.

E o que me fazia ainda mais feliz era saber que eu fazia bem à outra pessoa. 

Poucas sensações são melhores do que ter a certeza de ser o motivo do sorriso de alguém.

Após aquela primeira tarde passamos a nos encontrar com frequência, à beira da represa, o lugar que nos trazia paz.

Carinho, atenção, cumplicidade, tínhamos o que precisávamos, procurávamos, e parecia nos bastar.

Falar alguma coisa sobre meu passado? Ela nunca me perguntou nada, parecia não se importar com isso, então tudo estava ótimo daquela forma.

Já ela não tinha segredos, não me deixava com dúvidas, aos poucos fui conhecendo seu passado, seus dramas, alegrias, dores, sua história de vida.

Uma menina comum, e isso me trazia um misto de alívio e preocupação.

Alívio por saber exatamente quem ela era, mas preocupação por saber que, sendo uma humana comum, um dia partiria.

Quando, onde ou como isso aconteceria não fazia diferença, o que me importava é que ao lado dela eu sorria.

Não havia sexo, mesmo sendo ela muito atraente, os únicos contatos físicos que tínhamos eram os abraços e nossas mãos se tocando, e isso já me bastava.

Conquistar o corpo é relativamente fácil, mas conquistar a alma, isso não tem preço.

Mas aquilo parecia estar prestes a mudar quando, com o cair de mais uma noite, ao nos despedirmos, ela me entregou um bilhete.

- Cartinha de amor? – perguntei, brincando com ela.

- Não bobo, meu endereço. Você nunca me pediu, mas já está na hora de você me visitar, né? – ela entrou no carro.

- É, quem sabe... – ela era especialista em me deixar sem ação.

- Erik, sinceramente espero que você não seja gay, eu ficaria muito puta. – e ela, rindo, arrancou com o carro.

Novamente ela se foi e me deixou ali, sozinho, com um sorriso no rosto.

Eu adorava aquilo.

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