Havia deixado minha Casa já há alguns dias, seguia para o Sul, rumo ao continente onde planejava iniciar uma nova existência, sem saber ainda ao certo como o faria.
Montado em meu garanhão negro sentia-me solitário como nunca antes.
Montado em meu garanhão negro sentia-me solitário como nunca antes.
Pela primeira vez encontrava-me sem a companhia de meus irmãos de armas, dos serviçais da Casa ou de alguma mulher, somente o feroz rugido do vento gélido se fazia ouvir e a nevasca se tornava cada vez mais forte.
Ao longe avistei um vilarejo onde poderia encontrar abrigo e alimento.
Havia pouca movimentação nas ruas, devido à intempérie, mas não foi difícil encontrar uma taberna, o burburinho do local facilmente chegou aos meus ouvidos.
Prendi minha montaria à porta, um solícito rapaz surgiu e se prontificou a cuidar do meu animal e de meus pertences.
- Cuide para que nada de errado aconteça. – lhe recomendei, antes de adentar o local, que possuía certa movimentação.
Não era aconchegante, mas serviria para que eu descansasse e me alimentasse.
Assim que sentei-me em um canto uma simpática garota veio atender-me e prometeu rapidamente trazer o que havia pedido: vinho e carne.
Enquanto aguardava pude observar a movimentação, um guerreiro deve sempre estar atento ao se passa ao redor para evitar qualquer tipo de surpresa.
Os homens presentes eram diferentes daqueles aos quais estava habituado a conviver, suas atitudes eram rudes, pareciam sujos e usavam um linguajar grotesco.
Embora tenha vivido entre guerreiros, éramos educados, asseados e respeitosos. Sermos criaturas dedicadas à guerra e à destruição não significa que devamos nos portar como animais e provavelmente essa fosse a grande diferença entre nós da Casa Wallar para os guerreiros de outras Casas.
Mesmo incomodado mantinha minha habitual serenidade e pensava sobre o rumo que daria à minha existência.
O que aquele que se dedicou somente à guerra poderia fazer em um mundo que parecia viver momentos de paz?
Garotas que lá trabalhavam se esforçavam para atender aos pedidos, e embora sorridentes, era evidente notar o cansaço em seu semblante.
Fui então desperto de minhas conjecturas ao ouvir o som de uma bandeja cair e os protestos de uma das garotas.
Meus olhos seguiram para a direção do burburinho e vi então um homens agarrando o braço de uma das garotas que ali trabalhavam.
Ela, com evidente asco, o empurrava tentado impedir que ele a beijasse, mas uma de suas mãos grosseiramente teimava em erguer seu vestido.
O homem por detrás do balcão tentou ir ao seu socorro, mas outros dois o impediram.
O mundo parecia não estar tão em paz quanto eu imaginava.
Levantei-me da cadeira e caminhei até onde se dava a agressão.
- Solte-a. – disse calmamente, por trás do agressor.
Repentinamente o silêncio invadiu o local e, ainda segurando-a pelo braço, ele se voltou para mim com um sorriso sarcástico.
- Ora, ora, o que temos aqui? Cuides da tua vida!
- Solte-a. – repeti, dessa vez com mais robustez.
Finalmente a mulher se desvencilhou e caminhou para trás, foi quando aqueles que seguravam o homem do balcão se juntaram ao agressor.
Tão altos quanto eu, mas nem de longe possuindo minha imponência, não passavam de parvos, quando muito, vagabundos.
- Percebo não seres daqui, caso contrário não te intrometerias, imbecil.
Olhei dentro de seus olhos com frieza.
- Tens razão, não sou daqui, porém isso não me impede de defender quem necessita.
- Um justiceiro, que interessante isso. – debochou um dos companheiros.
Encarei-o da mesma forma como fiz com o primeiro e notei em seu olhar o deboche que me enojava.
- Quem acreditas ser? Sabes quem sou? Sou Siege, o maior guerreiro dessas redondezas e, acredites, acabas de encontrar confusão
.
Sorri com o canto da boca.
- Guerreiro... não te portas como tal.
- Quem esse infeliz acredita ser? – resmungou o outro que o acompanhava.
- Um guerreiro trata uma mulher com respeito, aliás, trata a todos com respeito. Não, tu não és um guerreiro, eu sou.
Livrei-me então do capuz que me cobria a cabeça, revelando-me.
Um burburinho tomou conta do local.
- Teu rosto me é familiar...
- Leão Branco! É o Leão Branco! – anunciou um homem, próximo à saída.
O parvo riu grosseiramente.
- Leão Branco... não te pareces com um, mas já ouvi falar de ti, o guerreiro de Wallar. Estás longe de tua Casa, e sozinho, pelo que vejo.
- Está sim, e somos três, o que pretendes fazer agora? – debochou um dos outros, desembainhando uma adaga da cintura.
- Talvez não sejas tão imortal sem teus irmãos de guerra, Leão... – ameaçou o agressor, aproximando seu rosto do meu.
- Sugiro que partam, e nunca mais voltem... – ele então riu.
De relance percebi o ataque do que empunhava a adaga, mas um chute foi suficiente para lança-lo ao chão e dar início ao meu embate com os outros dois.
O “maior guerreiro da redondeza” estava muito longe de ser páreo para mim e, ainda com a ajuda dos dois companheiros, não demorou muito para que tivessem o rosto enterrado na neve que se acumulava do lado de fora.
- Leão Branco, imploro que poupes a vida de meu pai! – implorou o rapaz que cuidava de meu garanhão.
- Teu pai... – murmurei enquanto segurava a cabeça ensanguentada do agressor contra a neve.
- Sim, guerreiro, ele é meu pai!
Soltei o homem como se livra de um saco de lixo e pus-me então de pé.
- Os três, desapareçam daqui, orem para que não mais os veja! – ordenei enquanto se levantavam e corriam, desaparecendo na nevasca.
O rapaz franzino se aproximou de mim.
- Agradeço, senhor, e saibas que sinto-me honrado em servi-lo.
- Não agradeça, retribua. Cuide de meus pertences e de meu cavalo, como vem fazendo.
Voltei para a taberna, onde olhares de gratidão e respeito me esperavam, e me acomodei à mesa de outrora.
- Nobre Leão Branco, diga-me, como posso retribuir sua ajuda? – indagou aquela que defendi, com um insinuante sorriso.
Encarei-a com seriedade.
- Vinho e carne, como pedi, são o suficiente.
2 comentários:
Gostei do Que li parece ser bom
Leão um verdadeiro cavaleiro
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